
Um grupo de engenheiros formados na Universidade de Brasília (UnB) e apaixonados pela ideia de expandir a educação aeroespacial, é o responsável pela primeira e única startup no mundo a oferecer um programa de educação que engloba toda a cadeia de uma missão espacial: do ensino da metodologia STEAM – Ciência, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemática – à coleta de dados de satélites reais lançados em foguetes. Um dos mais recentes projetos da empresa foi lançar três satélites de comunicação por meio da SpaceX (de Elon Musk). Os satélites foram desenvolvidos por estudantes da Arábia Saudita e do Azerbaijão.
A iniciativa foi criada em 2022 pelos sócios fundadores Rafael Paiva Lobo, Matheus Six, Leonardo Julio e Victor Baptista. Ela se destaca por ser um polo disruptivo que não apenas democratiza o acesso ao espaço, mas também descentraliza o setor aeroespacial brasileiro, historicamente concentrado em São José dos Campos (SP).
Rafael Lobo, diretor de tecnologia da startup, explicou ao JBr que o objetivo é levar para dentro da sala de aula a experiência de construir uma missão espacial. "Para que o aluno possa construir um projeto que tenta melhorar a sociedade ou o meio onde eles estão inseridos. Então, a gente tem projetos de meio ambiente, às vezes de logística, projetos diversos que conectamos com a parte espacial." Os alunos são ensinados a fazer a prototipagem, a montar um satélite de fato e a colocar no espaço.
Ele conta que a Ideia Space realizou esse projeto em Brasília, com 430 alunos. Desse total, 30 estudantes foram selecionados e construíram um satélite que ainda vai ser lançado. "E esse mesmo projeto a gente fez este ano com a Arábia Saudita e Azerbaijão", acrescentou Rafael. Na Arábia Saudita, foi um projeto com uma média de seis universidades, em que dois grupos de alunos foram selecionados para construírem um satélite cada. Os satélites foram lançados na SpaceX.
Lançamentos Históricos e o Diferencial Global
Rafael comentou sobre o lançamento dos três satélites de comunicação pela SpaceX, do empresário Elon Musk, que ocorreu no final de novembro. Dois desses artefatos foram desenvolvidos por estudantes da Arábia Saudita e um foi criado por alunos do Azerbaijão. "Esses satélites recebem uma mensagem e enviam de volta sem depender da internet, e o que eles vão fazer é definido pelos alunos na competição", explicou Rafael.
O que acontece com os satélites a partir do lançamento, é a fase de comunicação, um processo que a empresa chama de Educação Produtiva. A Ideia Space fornece aos alunos os dados coletados pelos objetos, permitindo que eles produzam projetos que vão além da teoria e alcançam o lado mais prático. "Por exemplo, um dos satélites da Arábia Saudita vai tentar enviar dados de sensores instalados em um projeto de reflorestamento, provando a tecnologia", explicou Rafael. Ele acrescentou que esses satélites de comunicação, que funcionam sem depender de internet, têm uma vida útil de cerca de um ano. Após esse período, eles param de se comunicar, diminuem a altitude, e retornam à atmosfera, onde se queimam e encerram a missão.
O diferencial é que a Ideia Space é, atualmente, a primeira e única empresa do mundo a fazer esse serviço ponta-a-ponta, cuidando da educação, da construção do satélite e da coleta final dos dados.
A startup brasiliense tem uma atuação a nível global da startup, por fazer parte da Federação Internacional de Astronáutica, garantindo assim, a constante inserção na comunidade espacial. "O setor espacial é muito nichado no mundo todo, todo mundo praticamente se conhece", afirmou. Esse envolvimento permitiu que a empresa construísse os contatos necessários para viabilizar os lançamentos. "Quando a gente começou a Ideia Space, já estávamos no meio, oferecendo o curso e a construção de satélite. Foi assim que conseguimos os contatos", contou.
De Brasília para o mundo
Representar a engenharia espacial brasileira a partir de capital, para Raafael, é um desafio. A concentração do segmento é tradicionalmente em São José dos Campos (SP), lugar onde ficam instituições como o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Embraer e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). "É um desafio, porque aqui em Brasília a gente começou meio que do zero", admitiu o diretor. Contudo, a capital oferece vantagens, já que para eles, Brasília tem toda a infraestrutura que empresas lá fora têm em questão de laboratório. A gente acha na Universidade de Brasília (UnB, os mesmos laboratórios que têm numa empresa da Alemanha ou da Inglaterra". Além disso, por ser o centro político, a proximidade com embaixadas e o governo facilita a articulação dos projetos internacionais.
O consultor Claudio Corrêa Junior salientou que atuar em Brasília é uma oportunidade de ser disruptivo. "A parceria que a gente tem com a UNB não é por sermos ex-alunos, mas porque os professores estavam abertos a receber a ideia", disse. Para Claudio, a parte positiva de estar na capital e longe da concentração em São José dos Campos é que a Ideia Space está trazendo algo diferente e fomentando a área na capital. "O setor em São José dos Campos é muito tradicional, mais fechado. Nosso propósito é realmente ser mais disruptivo, descentralizar o eixo e fomentar um outro polo aqui", completou.
Diversidade no setor multidisciplinar
Claudio apontou que, geralmente, nos cursos de engenharia — a aeroespacial em especial — há mais homens, por ser um nicho considerado mais masculino e tradicional. Entretanto, no projeto da Arábia Saudita, um dos grupos era inteiramente de mulheres e o segundo era formado por quatro mulheres e um homem. "Foi interessante e surreal. Do nosso grupo de 30 alunos em Brasília, 60% eram mulheres também", comentou. No Azerbaijão, o projeto também contou com 800 alunos de 42 escolas e o grupo que ganhou também era formado em sua maioria por mulheres.
Ele explicou que os projetos educativos da Ideia Space são realizados para difundir a metodologia STEAM em todos os níveis educacionais. No Azerbaijão, eles trabalham com o ensino médio; em Brasília, com o ensino fundamental e médio. "Nós temos a ideia de implementar e disseminar a educação STEAM na nossa forma de ver, com essa metodologia mais mão na massa." Ele nomeou essa prática da Ideia Space de "Joia da Coroa", que é o Desafio Espacial, em que eles levam o conhecimento para os professores, que será aplicado com os alunos. "A gente vai acompanhando esses grupos de longe, através dos professores, e na parte final do nosso curso, onde eles mexem mais com o satélite, a gente está 100% presente", contou.
De acordo com Claudio, para a concepção de missão, para entender o que é uma missão espacial, desenvolvimento e design, o material já é bem didático e pode ser trabalhado pelos professores. "O nosso diretor de tecnologia, o Rafael, junto com o Matheus Six, ficam sempre à disposição para tirar dúvidas com os professores."
O objetivo dos membros da Ideia Space é democratizar o acesso aos conhecimentos, tirando do nicho mais tradicional dos cursos de robótica e ampliando a visão das pessoas sobre o que a educação aeroespacial é. "Quando a gente trabalha com esse espaço, a gente atrai um público da arte, de história, geografia, pessoas que têm pretensão de fazer cursos de outras áreas", disse. Rafael complementou com o exemplo de que uma das primeiras alunas deles queria fazer direito. "Nós sempre gostamos de brincar com essa conexão, porque é um setor multidisciplinar. Qualquer agência espacial que você vai, você tem menos engenheiros do que, por exemplo, sociólogos ou filósofos."
Reforçando que a missão da Ideia Space é democratizar o acesso ao espaço, Rafael ressaltou ainda que eles também querem ampliar o sentimento de que os alunos são capazes de fazer um satélite e lançar. Além disso, o grupo quer mudar a perspectiva dos estudantes do DF, no Brasil e ao redor do mundo.
Em um projeto que eles realizaram, ao serem perguntados o que queriam ser no futuro, a maioria dos alunos respondeu que queria ser policial. "A maioria, por ter um às vezes um background mais violento, sempre cita delegados como referência, às vezes jogador de futebol, ou alguma coisa do gênero. Depois dos nossos cursos, geralmente a gente tem uma mudança de perspectiva", comentou Rafael. Teve uma aluna que participou de um projeto deles em uma Casa de Acolhimento, que de fato queria ser delegada. "No final, a gente perguntou de novo e ela falou que queria ser engenheira." Claudio acrescentou à fala de Rafael, declarando que a missão é também quebrar as barreiras e apresentar um leque muito maior de oportunidades para os estudantes.
Projetos para o Futuro
Com a missão de levar a representatividade brasileira para fora, a Ideia Space já tem projetos fechados para o futuro. Além dos três grandes projetos de Desafio Espacial já realizados em 2025 - Brasília, Arábia Saudita e Azerbaijão -, a empresa possui um contrato assinado com a Índia para o lançamento de cinco satélites. Um deles será o satélite de Brasília.
Além do programa educacional ("Joia da Coroa"), a Ideia Space também atua como intermediária técnica, ou broker, para lançamento de satélites. Este serviço é essencial porque grandes empresas como a SpaceX não vendem espaço em pequenas quantidades (como para um satélite de 500g), vendendo apenas grandes volumes. A startup se posiciona, assim, como o "meio-campo" que permite a empresas e universidades (como a do Maranhão, que terá um CubeSat lançado na Índia) acessar o espaço de maneira mais barata e viável. A expectativa é aumentar o número de projetos nos próximos anos, com conversas em andamento com cerca de cinco a seis novos países. Mas quanto a essas iniciativas futuras, Rafael quer que os planos se concretizem mais para dar mais detalhes no futuro.
Por fim, Rafael concluiu que eles aprendem muito com os alunos e a realidade de cada um deles. Ele comentou que as missões dos satélites são, inclusive, definidas pelos estudantes de cada grupo e projeto. A Ideia Space transmite os conhecimentos através da metodologia STEAM, mas os membros da startup deixam a criatividade dos alunos fluir.
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