"Negro e da maioria pobre que lota as cadeias, foi a estrela do
julgamento que impõe penas e prisões para os da minoria rica, até então
impune", diz a colunista da Folha; o Brasil precisa de revanche social
ou de Justiça?
A colunista Eliane Cantanhêde avalia que, na Ação Penal 470, Joaquim Barbosa foi o "homem certo no lugar certo". |
BRASÍLIA - Não por
mera ironia do destino, o processo contra Fernando Collor se arrasta há
duas décadas, ele vem ganhando todas e tem mandato de senador da
República, enquanto dois de seus algozes, José Dirceu e José Genoino,
vão para a cadeia.
Veja como é a história: Lula já
confraternizou com Collor e justificou o impeachment como mero joguinho
político, o efêmero PRN nem existe mais --na prática e na memória-- e o
PT vive o suplício de ver dois de seus ícones presos.
O enredo é novelesco, com a lenta
inversão de papéis, o mensalão, o julgamento, até a coincidência de
datas --as prisões saíram no aniversário da Proclamação da República.
Destaque para os protagonistas. O
réu mais ilustre é José Dirceu, ídolo de uma geração: líder estudantil,
revolucionário de romance, presidente que conduziu o PT da utopia para o
pragmatismo e homem forte do primeiro governo de esquerda.
A condenação mais doída é a de José
Genoino, o sobrevivente do Araguaia, a voz da ponderação no PT e uma
referência de congressista: leal, hábil e eficaz.
Ambos em simbiose com banqueiros,
empresários, publicitários espertalhões e líderes de partidos
historicamente adversários do PT.
Joaquim Barbosa, levado por Lula,
foi o homem certo na hora certa da história. Negro e da maioria pobre
que lota as cadeias, foi a estrela do julgamento que impõe penas e
prisões para os da minoria rica, até então impune.
Cada peça e cada detalhe se encaixam
num todo surpreendente. Nenhuma ficção poderia superar essa realidade,
que vira uma página no país e abre outra cheia de expectativas e também
de dúvidas.
Quando o PT entrou no vácuo do PRN,
Dirceu aderiu aos métodos de Collor, a vitória subiu à cabeça de Lula e
os fins --fossem quais fossem-- justificaram todos os meios, tudo
poderia acontecer. E aconteceu.
De Collor a Dirceu, uma evolução: só a punição política já não basta.
Fonte: Brasil247
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